sábado, 28 de julho de 2012

Poema de Ruy Belo


Ruy Belo
(1933-1978)


E tudo era possível

Na minha juventude antes de ter saído 
de casa de meus pais disposto a viajar
eu conhecia já o rebentar do mar
das páginas dos livros que já tinha lido

Chegava o  mês de maio era tudo florido
o rolo das manhãs punha-se a circular
e era só ouvir o sonhador falar
da vida como se ela tivesse acontecido

E tudo se passava numa outra vida
e havia para as coisas sempre uma saída
Quando foi isso? Eu próprio não o sei dizer

Só sei que tinha o poder de uma criança
entre as coisas e mim havia vizinhança
e tudo era possível era só querer


Árvore rumorosa

Árvore rumorosa pedestal da sombra
sinal de intimidade decrescente
que a primavera veste pontualmente
e os olhos do poeta de repente deslumbra

Receptáculo anónimo do espanto
capaz de encher aquele que direito à morte passa
e no ar da manhã inconsequentemente traça
o rasto desprendido do seu canto

Não há inverno rigoroso que te impeça
de rematar esse trabalho que começa
na primeira folha que nos teus braços te desponta

Explodiste a vida e és serenidade
e imprimes no coração mais fundo da cidade
a marca do principio a que tudo remonta



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